sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Beati, qui audiunt

                            



Tanto tempo que não me perfumo,
não faço a barba, não ligo pro cabelo.
Vivo só, sem rumo, sem ninguém,
sem lugar nenhum pra ir,
sem lugar nenhum pra ficar.
É tudo tão o mesmo;
Tudo tão estreito e ao mesmo tempo largo.
Ao passo que vivo só, sinto-me do mundo,
das árvores, das águas,
quer sejam turvam, quer sejam claras.
Sinto-me do céu, dos ventos,
da noite, da solidão, das carícias,
dos açoites, da escuridão.
Mas de gente? De gente não.
Não sou de ninguém, as pessoas machucam.

Há tempos deslizo-me rumo ao fim,
ao mesmo tempo em que,
sinto um profundo desejo que a vida inicie,
pois ainda não me indicaram com um estouro que
devo iniciar a partida.
Sinto-me ninguém e, ás vezes, lenda,
impossível de ser esquecida,
embora não cative nem uma lebre,
mesmo que a salve de ser presa de um lobo
tão cruel quanto minhas feridas.

Faz tempo que, canto aos loucos, canto aos poucos,
sem melodia, sem poesia,
profiro um zumbido que nada diz,
aos poucos com alma humana
destituída da beleza da magia.
Bem aventurados aqueles que me ouvem,
pois destes partem o entendimento da vida.
Sou puro, humano, nada além,
sem nem um resquício de sobrenatural,
sonho e só, como todo mundo,
em tornar o meu mundo mágico e antinatural,
é tão humano.
Acabo de crer que não passo de um terrível engano,
Não diferente de tantos.


     Samuel Ivani 

Nenhum comentário:

Postar um comentário