quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Uma vida normal





Eu queria ter  tido uma vida normal, como todo mundo.

Um jovem comum, de pele comum, encontra um suposto amor aos 14 anos. Ela era linda, pelo menos aos olhos dos seus hormônios a flor da pele típicos da adolescência. 
Depois de dois meses de namoro, ela engravidara. Ele, sem opções, fora obrigado a largar os estudos pra trabalhar fosse no que fosse para ao menos fingir que poderia sustentar o filho e a garota. Depois de um tempo, conseguiu levantar o que poderia se chamar de moradia de dois cômodos nos fundos do terreno dos pais da companheira, e lá viveram até que, os 16 anos, a natureza os agraciou com mais um filho. 

Depois de um tempo ele percebe a grande bosta que a  vida havia se tornado. O quanto tudo aquilo não fazia sentido. O quanto ainda era jovem e poderia está aproveitando mais a vida.   Então, munido destas convicções, vendo que não era justo que a única diversão da sua vida fosse dez minutos de fornicamento diários com uma garota com os couros do bucho mole devido os dois filhos que tivera, entrega-se ao álcool em demasia como uma forma de fazer justiça em relação à vida. 

Aos sábados, invariavelmente,  como que numa promessa, depois de trabalhar a semana inteira na lavoura e de ter economizado, a duras penas, todo o dinheiro da semana, ele sai com a desculpa que iria comprar o janta no intuito  de passar naquele bar ridículo onde trabalha uma puta aposentada por tempo de contribuição, mas que não conseguiu largar completamente o ramo. Mais de sessenta anos e ela tinha cheiro de puta e ainda ostentava aquele trejeito natural para arrancar até o último centavo dos poucos que ainda cometiam o erro de parar lá. Pensava ele, que poderia  ir ao um cabaré de qualidade, porém, sabia que o dinheiro era pouco. Poderia ir algum lugar que não tivesse putas e, sim, ninfetinhas da sua idade, no entanto, sempre que ele se olhava no espelho, via o quanto às longas jornadas de trabalho diário haviam o tornado ridículo; magro, com a pela massacrada pelo sol, olhos fundos; era o perfeito retrato de um caboclo de quarenta anos. Então via que o único local que poderia ser tratado como gente era naquele bar ridículo.  Como ele era o único cliente da puta aposentada, ao menos lá,   o álcool e as carícias das mãos ásperas da velha dama da noite o  fazia se sentir importante.       
 
E em um desses sábados, não diferente de tantos outros, depois de gastar todo o dinheiro, e não mais receber  o mesmo tratamento naquele digno estabelecimento, ele se dirige pra casa sem conseguir nada além de torrar todo o suado fruto do seu trabalho. Alcoolizado, sente que tudo aquilo fora um grande erro, que deveria mesmo era ter comprado o jantar, pois também sentia fome. Ao chegar a sua casa, ver a garota que pensou que ia ter sempre a pele lisa, os couros firmes, sentada na velha cadeira com os peitos caído tentando amamentar o filho mais jovem, enquanto o mais velho pergunta pela jantar.  Ele ver aquela cena, e sente um profundo ódio de si mesmo. A sua pobre e calejada esposa, cansada daquela rotina toda semana, apenas o fita com um olhar de desprezo. Ele então, não aceita aquele olhar. Ele queria que ela gritasse com ele, que o colocasse no seu devido lugar porque ele era um merda. Ele tinha consciência que merecia sim, uma surra, mas quem seria capaz de dar essa surra nele? 

 Irritado com toda aquela falta de ação da pobre moça, ele, sem dizer uma palavra, chega até as poucas panelas sobre o velho banco improvisado como uma prateleira para os poucos alumínios que tinham e o vira contra a parede provocando um estouro enorme, desencadeando um choro coletivo dos dois filhos e da sua companheira. A pobre moça, sem opções, apenas pede pelo o amor de Deus que ele se acalme.  O jovem então, enojado mais ainda com sua atitude sem sentido e vendo o quanto estava fazendo sofrer sua companheira e seus filhos, sente que merece morrer. Mesmo assim, sua companheira, pobre coitada,  para proteger sua vida e  sua prole, enquanto chora, diz que o ama e que não se importa com as suas bebedeiras. O jovem, cada vez mais se sentindo um lixo por aquelas palavras que não merecia, dispara uma bofetada contra o rosto da esposa.  E sentindo-se indigno de viver, percebendo que aquilo não acabaria bem, sai de casa com a certeza que se ficasse, mataria alguém, pelo simples fato que ele, era quem merecia morrer.



Ele dorme ao relento, como de fato merecia - e retorna na manhã seguinte como se nada tivesse acontecido. O velho banco já se encontrava no lugar de sempre, o olho da sua companheira se encontrava roxo, mas demonstrando querendo esquecer, ela sorria enquanto preparava o café preto para ser bebido em mais um dia como qualquer outro. Ele toma o café churro, sente-se fraco, mas para não demonstrar sai novamente pra mais um dia comum de domingo em que retornaria bêbado pra casa. 




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