quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Meus vinte e poucos anos


Chegaste aquele ponto meu caro! Não és mais um jovem. Não tens mais a mesma energia. Creio que já notaste, embora a duras penas, que tu não és o centro do universo e que, se ele conspira alguma coisa na tua vida, é sempre a favor dos outros.  Agora, diz-me o que construíste? Que castelos tu levantaste? Que sonhos realizaste? Tolo idiota, viveu a vida deixando escapar os amores, os amigos, as pessoas. As pessoas se vão, é natural! Amigos te restam dois ou três. Talvez preze pela qualidade e não pela quantidade, ou talvez tu que esteja já rabugento e não tens mais paciência pra cativar Deus e o mundo.  A vida meu caro, requer construir qualquer coisa. E tu, coitado, és uma maldita fábrica de construir inutilidades. Era preciso que tu construísses casas, cercasse terrenos, criasse rebanhos e mais rebanhos de cabras. Mas não, aqui está você nesse mundo metafísico sem construir nada que assegure alimento para tua prole. És de fato um inútil! Se a vida passar, e tu não deixar herdeiros, será de fato um fracassado.      

Chego a esta idade e não tenho um rebanho de cabras, não tenho sequer um lote de terreno pra cercar, não tenho filhos pra criar, não tenho esposa pra trair, eu sequer posso ser corno.  Não dá!

..........................................................................................................................

Por ventura, quereis tu traçar linhas imaginárias entre os pontos das sardas criadas pelo tempo?! Ora, não vês que se houveram amores não vividos nesses nossos muitos anos, foi por falta da minha incapacidade. Não há desenhos que se forme entre nossas sardas. Em nossas mãos ossudas, apenas evidencia-se o tempo. Nessas veias azuis como penas das galinhas da Angola, permeiam apenas o tempo. Nossos timbres já trêmulos não têm a mesma potência que tínhamos nos anos dourados do rádio. Não cantamos mais juras eternas de amor. Não há mais óperas. Não há mais gritos! Ó, tempo, tiraste-me até as estórias de cavaleiros. Tirou-me os cestos de cipó, a idas aos teatros, a vida! No fim, perde-se a vida, ganha-se a batalha! Porém, se olho para trás, vejo fracassos, sonhos sonhados com intensidade e quase nada de realidade. Ah, os amores! Vede: não os vivi, nem por uma vez que fosse. Deixamos que o tempo nos desse apenas amargas lembranças daquilo que não vivemos. 

Tu não tens mais aquele sorriso. Ainda tem aqueles olhos, mas neles já se vê gasta uma vida! Não há mais tempo. Amei-te tanto, tínhamos tanto para ser vivido antes. Se daquela vez que te enviei telegramas jurando-te fidelidade, jurando-te nunca mais esquecer-te, tivesse me enviado uma resposta dizendo-me apenas para ter calma.   Mas não. Tu me ignoraste, agora, amargamos esse amor nunca vivido.   

Nenhum comentário:

Postar um comentário