quinta-feira, 27 de outubro de 2016

VÍSCERAS



O estômago grita!
As vísceras vazias ecoam um pedido universal.
As lágrimas descem cálidas cortando a dor a espera do amanhecer.
A noite dura uma eternidade.
Os sonhos resumem-se um humilde prato
de feijão com farinha.
Deus! É tão pouco!
A mãe, durante a tarde, mesmo com pouca esperança,
fora ao quintal, trouxera lenha e ascendera o fogo.
Questionada pelos filhos o porquê de tal ato
uma vez que não tinha nada o que cozinhar, responde:
-Teu pai há de voltar com alguma coisa.
Ela sabia que ele não voltaria antes do amanhecer,
mas era preciso dar alguma esperança aos filhos.
Ela mesma precisava daquela esperança, mesmo sabendo que o pai, se empaturrando de álcool, não traria o almoço, que agora já era o jantar.
Então, a mãe e seus cinco filhos se dispõem a beira das chamas,
alimentando-se do calor e do fumo de lenha de cajueiro.
Era o que tinham.
Aos poucos, as chamas vão morrendo restando apenas brasas escarlates.
A mãe, com os olhos cheios de lágrimas, nota que os filhos também vão se dando conta que o pai não há de chegar com o jantar.
Aquelas brasas lhe figurava uma dor dilacerante.
O filho mais velho, movido pela fome,
tenta aguçar o máximo os ouvidos a fim de ouvir o barulho da bicicleta do pai retornando ao lar.
Mas sua força de vontade não era suficiente.
Qualquer que fosse o movimento das folhas ocasionados pela brisa da noite no quintal,
os seus olhinhos brilhavam, pois tinha certeza que era ele.
Certeza movida apenas pelo desejo que fosse.
Mas não era...Não era!
Ouvem-se os gemidos, as reclamações, a fome.
A mãe, coitada, inerte, aconselha que os filhos se deitem e durmam,
assim, esqueceriam o vazio nas entranhas.
Não funcionando, aconselha que aconcheguem o lençol
por sobre o abdômen e o segure com as pernas a fim de que diminua os espaços entre as vísceras, assim, disfarçaria a fome por uns instantes.
Por um minuto ou dois, não se ouve o barulho do vazio.
Só que o tempo não para.
O filho mais velho, já não deseja que o pai retorne.
Deseja que ele encha-se de álcool, adormeça em uma poça de lama
e morra afogado.
A verdade é que o sono não vem!
"Como esquecer a fome se o sono não vem?"
As lágrimas que deslizavam no seu rosto eram como lavas vulcânicas;
elas caiam queimando os seus sonhos,
seu coração, seu amor, seu futuro, sua vida.
Até que amanheceu.
Por muito tempo, tudo permaneceu assim, sem alterações.
Tudo se repetia como se todos andassem em círculos.
Mas eis que o tempo passou, como sempre passa.
Já na faculdade, o filho mais velho ouve de seu professor que a fome é psicológica.
Pobre homem, pobre homem!
Tão instruído e não sabe a diferença entre estômago vazio e fome.

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7 comentários:

  1. Oie, achei esse poema, forte demais e bem triste, acredito que relata muito o que as pessoas estão vivendo.. um sofrer muito grande.
    Beijinhos, Helana ♥
    In The Sky, Blog / Facebook In The Sky

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  2. Nossa, que poema forte!
    Especialmente a ultima frase me fez refletir bastante!

    bjs

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  3. Texto bem forte! Chega a deixar a gente refletindo alguns instantes.
    Adorei!

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  4. Olá,

    Parabéns pelo texto, muito bem escrito e que prende o leitor.
    Desejo muito sucesso nas vendas e que nunca desista do seu sonho :)

    Beijos,
    entreoculoselivros.blogspot.com.br

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  5. Olá!
    Que história triste. Sabemos que muitas crianças sofrem isso todos os dias. As pessoas que não passaram isso nunca vão saber o que é ter fome, deve ser uma coisa horrível, não posso falar pois nunca passei graças a Deus. Temos que ter mais compaixão pelo nosso próximo.
    Apesar do texto ser triste, tem uma mensagem muito construtiva.
    Beijinhos!

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  6. Nossa que denso e triste. Ela me tocou muito, apesar de não gostar de poemas e poesias. São essas coisas que nos choca e nos traz a realidade da vida. Reflexiva
    Beijos,
    diariasleituras.blogspot.com

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  7. Olá,
    O poema é muito profundo, e nos faz refletir sobre as mazelas humanas podendo ter várias interpretações. Gostei muito.
    Abraço.
    www.bibliotecacrazy.blogspot.com

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