terça-feira, 5 de setembro de 2017

Víbora



14 anos, olhos grandes, cabelos negros e uma ganância feroz que lhe acompanhava subentendida em cada sorriso, em cada piscar de olhos, em cada rebolado que desferia propositadamente nas faces dos bobos enquanto caminhava. Não se sabia se aquela ambição lhe era natural ou imposta, mas que ela queria se dar ao mundo e em troca receber o mundo de volta, isso ela queria. 
Inquieta, aquela aparente menina meiga, nunca se dava por satisfeita; ela queria andar, conhecer, viver... É certo que todo adolescente necessita gastar as energias oriundas dos hormônios à flor da pele típicos da idade, mas ela era tal qual animal no cio que caminha horas a fio a procura de parceiros sexuais. Dizia-se que tal inquietude era devido as inúmeras cervejas que a mãe tomara enquanto estava grávida dela. Eu não sei!  Sei que, justificada pela ganância, várias outras malícias foi sendo aos poucos desenvolvida naquela garota inegavelmente bela e perigosa. Sem escrúpulos, ela pisava, sugava e iludia aqueles coitados que se deixavam levar por seus encantos, e acreditem, como eram tantos...  

Apesar de jovem, ela era mestre na arte da mentira. E como mentia aquela menina! Talvez exatamente por influência dos pais, ou porque a ensinaram mentir, ou porque se deixavam acreditar em suas falácias, lhe dando assim margem pra continuar no erro. Se ontem ela havia ido pra uma missa na cidade vizinha; hoje tinha um aniversário da filha recém-nascida de uma amiga sabe-se lá onde; amanhã teria que inventar um batizado, um casamento, qualquer desculpa bem elaborada para os pais fingirem que se importavam com suas saídas diárias. Talvez suas mentiras se devessem às oportunidades, pois o que não faltavam eram homens pobres, ricos, novos, velhos, lhe ofertando praias, celulares, joias e jantares em troca de algumas horas da sua companhia, assim, não lhe faltavam opções. Mas esses homens só ganhavam mesmo seus sorrisos poucos sinceros, seus olhares de soslaio, suas cruzadas de pernas de minissaia, e a exibição de uma menina linda e nova em algum restaurante caro e nada mais. Ora, ela sabia que guardava um tesouro valioso que a partir do momento que o primeiro tocasse, perderia gradativamente o valor. Assim sendo, ela o mantinha a sete chaves, embora aos mesmos custos do vulcão ao tentar conter as lavas antes da erupção. 

Naquela vida, cedo ou mais cedo ainda, era sabido que o seu tesouro seria resgatado, ou entregue a alguém, portanto, ela foi instruída que tomasse precaução de pelo menos entregá-lo para alguém de posses. "É melhor que encontre uma árvore que te proporcione sombra". - Escutava ela essa frase dos próprios pais quase que diariamente.  Não julgo-os, é natural do homem querer garantir segurança e conforto as futuras gerações. 

Com essas malícias, ela matava á unhas coloridas uns e outros, sempre fingindo para aquele que lhe fazia companhia no momento que não havia mais ninguém na sua vida. Porém, sabendo esses outros que sempre existiam outros, se matavam de ciúmes e, por conseguinte, elevavam seus esforços a estratosfera para mantê-la por perto. E ela sabendo disso, sorria como quem tudo queria; fingia que sentia ciúmes de todos, ou talvez possessiva, nem precisasse fingir, o que a tornava a mais bela víbora do deserto. Ela mantinha aqueles homens competindo por ela como uma cadela no cio que deixa os machos brigarem entre si para, no final, escolher o vitorioso. Não a julgo por isso, ela só estava sendo humana.

Ora, astuta, ela sabia que tinha todos nas mãos e que bastava um piscar de olhos pra que eles lhe trouxessem refresco e uvas à boca. E ninguém, por mais bruto que fosse, conseguia feri-la, nem mesmo com golpes de vestidos de seda. Ah, ela tinha o trejeito natural ou ensinado de ganhar os homens e moldá-los a sua maneira. E como ela usava tais habilidades... Seu único defeito era a pouca idade e consequentemente os hormônios que carregava no corpo, pois uma hora ou outra, era certo que algum homem experiente iria usar  o seu tesouro. Era só questão de sorte, ou azar de quem estivesse com ela no momento que as lavas do seu tesouro entrasse em erupção, pois não importaria as instruções, os sábios mantras, ela certamente o entregaria a um mendigo, se ele estivesse por perto. Sabendo disso, todos que conviviam com ela, torciam, recorriam a simpatias, sacrificavam cordeiros, rezavam e imploram aos céus pra que fossem eles e não outro a ter essa sorte, ou como disse, azar.

Porém, tanto esforço em manter seu tesouro seguro foi por água a baixo quando um colega da turma da escola foi fazer um trabalho na casa dela ás nove da manhã em um dia que seus pais deixaram-na sozinha. Que desgraçado! 

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